31 de maio de 2008

ENTREVISTA


A equipe de Dilatando o Tempo entrevistou, por ocasição do 2º. Encontro Latino-americano de Esquizoanálise, o nômade pensador Roberto Carlos Veloso, PhD, estudioso de Deleuze e Guatarri. Licenciado em Psicologia pela UFC, Mestre em Educação pela PUC - RJ, Doutor em Ciências da Comunicação pela USP - com sanduíche em Ball State University e pós-doutor na Université Paris V - René Descartes. Atualmente é professor visitante da University of Alberta e Mcgill University no Canadá.

Gato Félix: Deleuze afirmou: “O problema, para a sociedade, é o de parar de vazar.” Qual o sentido real da expressão “parar de vazar”?
RCV: Um quadrado pode melhor explicitar a expressão: um quadrado é diferença por natureza. É pura diferença, diferença em si. É um território de multiplicidades, de disseminação de saberes e encontros diversos e variados, de composições caóticas, de flutuações perigosas, de contágios incontroláveis, de acontecimentos insuspeitados. Um quadrado é, por natureza, rizomático, porque é território de proliferação de sentidos. Apesar de tentativas de controle, de áreas demarcadas e opiniões sobre como evitar a desorganização em um quadrado, tudo pode vazar e escapar.

Zara: Porque a intervenção urbana é centro de interesse de deleuzeanos?
RCV: A intervenção urbana dialoga com o devir da cidade pois introduz desvios poéticos, questionamentos sexuais, sociais, políticos ou estéticos oferecendo o que faz falta na arte contemporânea. Utilizando-se dos códigos da hiper-super-realidade-saturada-pós-moderna, artistas e coletivos nômades promovem ações e interferências criativas absurdas ou surreais, que podem desaparecer rapidamente, fazem a verdadeira transgressão com a ferramenta-arte.
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Edileuza: Qual a melhor definição para cyberfeminismo?
RCV: O cyberfeminismo é uma prática pós-feminista na rede. O cyberfeminismo é a grande esperança na construção de uma nova ordem, pois põe em evidência a questão de gênero e identidades. É um território tecnológico e ao mesmo tempo trans gênero e, portanto, político. Rompe com o domínio masculino no cyberespaço, pois as mulheres net-ativas dão um frescor à rede. Despudoradas, transformam-se em iconoclastas frente aos princípios do feminismo clássico em todo o ambiente virtual, desenhando uma nova cartografia da relação corpo-potência. Ou seja, queimar sutiãs é coisa do passado.

Edileuza: han-rammm...

O eu é o outro: levanto a discussão deleuzeana sobre imagem-movimento, imagem-tempo, o que pode a imagem?
RCV: Uma imagem em movimento, articulada com outra imagem em movimento, impõe aos nossos sentidos várias questões. Vertov instaurou uma ordem cinematográfica na contramão de seu próprio tempo. Diferentemente de Vertov, os cineastas capitalistas transformam imagens em mercadorias. Eles não acreditam na potência da articulação das imagens, não discutem com o espectador. Esquecem o valor de montagem em Vertov, que faz emergir no espectador uma consciência da imagem. Nós, como espectadores somos um campo de possibilidade de afetar e de ser afetado por imagens, e não sabemos o quanto podemos afetar e ser afetados. Mas tudo é sempre uma questão de experimentação. A imagem pode tudo, mas essa potência-imagem necessita de um laboratório experimental de imagens, não da venda de clichês do cinema comercial. Mas existem grupos que estão, como Vertov esteve em seu tempo, na vanguarda, na contramão do cinema comercial. Ninguém detém a câmera-olho! Ela segue experimentando por todos os espaços inauditos, quer seja em escolas de audiovisual, em grupos de jovens que com suas câmeras experimentam incessantemente o devir das imagens, etc...

Zara: Então, como preencher esse poder de afetar e ser afetado?
RCV: Somos um corpo sem órgãos, somos um grau de potência, definido por nosso poder de afetar e de ser afetado, e não sabemos o quanto podemos afetar e ser afetados, é sempre uma questão de experimentação. Não sabemos ainda o que pode o corpo. Deleuze insiste: ninguém sabe de antemão de que afetos é capaz, não sabemos ainda o que pode um corpo ou uma alma, é uma questão de experimentação...

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